14.7.06

Ela achou que era melhor não me ligar de madrugada.
Como se eu não estivesse acordada, sonâmbula, vidrada,
Jogada na cama, revirando os meus cds, procurando palavras.

Ela achou que não convinha incomodar.
Como se eu não estivesse morrendo, já.
Escorrendo pelas bordas, furada, amassada.

Ela achou que era melhor só esperar.
Como se eu não estivesse esperando por ela.
Dura, presa, trancada. Com frio. Descoberta.

Eu queria sentir frio. Eu queria sentir outra coisa qualquer.
Outra coisa que não fosse querer sentir aquela mulher.
Levantei, bebi água. Água gelada. Bebi do gargalo da garrafa.
Pouco me importa a higiene quando já não me sinto gente.

Ela achou melhor não responder.
Como se eu não precisasse daquela resposta para voltar a viver.
Aquela resposta. Aquela: que me fizesse morrer.

Ela achou melhor não dar corda à minha vontade.
Como se minha vontade precisasse de outra coisa que não a felicidade.
O pior é que nem minha, mas dela. Só dela, só ela.

Ela achou melhor não me deixar ouvir a voz dela.
Como se eu não estivesse ouvindo a voz que eu inventei para ela.
O tempo todo, em vários tons, em cada som. Todos os sons eram ela.

Ela achou melhor me deixar no meu canto.
Como se algum canto no mundo pudesse ser meu.
Não pode, que assinei aquele papel e dei tudo o que era eu.

Ela achou melhor que eu chorasse sozinha.
Como se alma diferente disso fosse a minha.
Ai, as lajotas do meu banheiro todas têm nome e família.

Ela achou melhor acabar com tudo de uma vez.
Como se fosse possível, com o que ela fez.
Aquele cheiro que todos os meus perfumes respeitam.

Ela achou melhor alguma coisa que eu não sei qual é.
Como se fosse possível algo ser pior que isso.
Me sento no chão da cozinha: sou borra de café.

1 Comments:

Blogger Carmen Sandiego se meteu e disse...

Antes que perguntem!

Não, eu não me divorciei.

Isso é velho, ok?

Desparanoicizantemente,

Carmencita

2:59 PM  

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