29.7.09

Tango Queer

¡Hola, chicas y chiques! ¿Como están?

Acabei de voltar de uma viagem de 2 semanas pela cidade mais gay-friendly da América Latina. Uhuuull
Os prédios antigos e bem conservados de Buenos Aires, suas árvores sem as folhas, os stencils dando um ar ainda mais politizado à cidade:


by me

Ai, ai... valeu a pena...

Mas vamos ao que interessa, não é mesmo? Turismo de grupo de ônibus não é o que se espera desse post.

Depois de tacar sua (enorme) mala no dormitório do hostel, qual a primeira coisa que você deve fazer? Procurar o Gay Map, mas é claro!!!! Você corre pra procurar um dos pontos de informação pra turista e.......tá fechado. Nããããão!!!! /o\ - dia 1: 1x0 pros Portenhos

Você olha pro letreiro: Axel Hotel. "É aqui mesmo!" Na porta percebe que tem algum evento acontecendo. Logo te informam que tem que ter o nome na lista pra entrar e que o tema é - nada que você vá ficar muito triste de não participar - algo sobre negócios voltados para o público gay.
Na recepção um viado muito bonito te entrega o G Map e fica te olhando. "Saco." Pra não ser muito grosse eu pergunto se ele sabe algo sobre lugares dirigidos às gurias. "Casa Brandon, hmm, não é a primeira vez que falam do lugar." dia 2: 1x1. Boi Bill empata.

Os dias passam, o casal francês que você adorou te conta que vai embora no próximo dia;
estão os três no quarto: eu deitade, estou nos últimos capítulos de Stone Butch Blues. Ela - você já deu uma espiada - lê Foucault. "Ai, ai...nem é gata. Ah, e é casada também."
Do nada, por algum motivo totalmente desconhecido e absolutamente sem nexo com a realidade, ela pergunta se você já ouviu falar de Judith Butler. "Claro!" A guria ri e diz já ter conhecido - não biblica (Uh! Na trave!) - mas pessoalmente a musa des Queer e simpatizantes: estava num café, uma fancha cantava ou dizia alguma coisa sobre não gostar das teorias da Butler. No final, Judith levanta e se apresenta à uma fancha levemente avermelhada, dizendo ter adorado o que a menina falou.
A francesa fala alguma coisa sobre achar estranho uma lésbica se colocar contra a teórica queer. Você concorda, mas depois fico pensando: não...não é tão difícil entender. Só quem sente, mesmo que de leve, o incômodo que o binário de gênero pode causar, é capaz de "entender". Conversa boa! 2x1 pre gender-queer aqui.

Caminhando pelas belas ruas de Palermo com chuva e frio, tudo o que você vê são lojas e mais lojas. Finalmente você chega à Plaza Cortázar, ponto turístico cheio de bares e lojas. Entrando numa delas, um casaco listrado te chama a atenção e, enquando você se dirigir pra perguntar o preço pra vendedora, do seu lado vê uma guria te olhando. "Hmm, uma fancha gatinha!" Faço que não vejo, pergunto pra outra se tem um número menor - não tem - e se posso vestir. A fancha continua olhando e você dá a resposta internacionalmente conhecida, aprovada e sancionada pela Presidente do sindicato: olha de volta sem mostrar TANTO interesse e faz que não entendeu.
Depois de vestir o casaco, abro a cabine pra olhar no espelho. Dou de cara com a guria, que tá lá, também seguindo o protocolo: finge fazer algo de extrema importância pertinho da cabine.
O casaco não ficou legal, é da sessão masculina e só tem M. "Droga!" Enquanto devolvo pra vendedora, percebo a mulé lá, ainda dando mole. Agradeço e vou saindo da loja. Mas aí eu paro, dou de ombros, volto, pergunto se a fancha trabalha lá e que horas sai. "Sí. A las ocho."
Fomos à Casa Brandon. Foi bom:


Casa Brandon


Agora você tem um objetivo: ir ao Tango Queer! SIM, temos tango pra gente!!!


Cartãozinho

"Todos los Martes
." Terça-feira. Boa! 21:30. Partiu!
Chego às 21:40. Na recepção a menina diz que a aula começa antes, que a Milonga - quando a galera vai dançar - é as 21:30, a aula é as 20hrs. "MERDA!" É sua última terça na cidade. "E agora? Assistir ou não assistir? 15 pesos só pra ficar olhando? Hmm...olhando gurias dançando tango!?"
Você sobe, abre a porta e:


photo © Emily Anne Epstein 2009

(Como eu fiquei com vergonha de ser a única sentada, tirando foto, tem umas aqui. O lugar é o mesmo.)
Muitas coisas aconteceram ao mesmo tempo:
eu sentei, completamente hipnotizada pelas pessoas na pista - a aula parecia estar no meio pro final. A maioria era de mulheres: vestidos, saias, salto alto. Você acha graça de ver que a única que aparenta ser butch - e eu lá sei como ela se identifica! - é a professora. No meio da multidão nota um casalzinho que faz o seu tipo. Ou melhor: uma delas faz. Cabelo batidinho, camisa preta, calça larga. Você esquece que não deve ficar encarando dessa maneira - é tão incrivelmente bonito! O corpo, as pernas quase se tocando, girando, se olhando. "Morri!" Ela percebe que você tá olhando e dá uma encarada. Eu desvio. Olho as outras duplas, a professora me intriga e eu começo a prestar mais atenção. "É elA, não é?!" Eu não costumo ter dúvida, sabe. É que nem com fancha, sempre dá pra saber. E, apesar de não ter dúvida de que é female born, a questão fica no ar.
Eu fico entre o leve incômodo com a professora e o delicioso incômodo das pessoas dançando, e eu ali, sentada.

A aula acaba e eu decido ir perguntar pra professora de outros lugares com boas aulas de tango. Quando ela pede pra eu esperar um pouco, um susto: a voz é de um cara! Eu fico zonza, sem entender bem o motivo. Não estou mais prestando atenção nas pessoas. Ela volta e eu não estou prestando muita atenção: olho as roupas, o cabelo, o jeito. Queria que a conversa fosse outra, mas é claro que nada além de tango pode ser discutido.

Você está sentade conversando com algumas mulheres mais velhas, trinta e poucos, que são muito simpáticas. Uma delas, até beeem bonita, dá mais papo. Conversa, pergunta, responde. Será que é a idade dela que deixa você menos confiante? Sim e não. É uma auto-confiança diferente, uma atitude, sei lá. Situação inesperada e nova. Gostei dela. (Com o canto do olho você percebe onde a fancha gatinha da pista se senta.)
De repente percebo que a mulherada ta levantando. Vão uma a uma se despedindo de mim. A fancha da atitude dá um sorriso e pergunta se nos vemos na próxima aula. Eu respondo que não, volto na segunda pro Rio. O sorriso some. Ela se despede e vai. Eu penso: "é, deveria ter agido antes." Uma das mulheres chama uma guria do outro lado, diz meu nome e fala pra eu ir ficar com elas. É o grupo da fancha gatinha!

No meio da conversa descubro que a guria é americana, ufa, o inglês facilita a vida das duas. Até porque, do nada estamos discutindo política e direito: Constituição americana x brasileira, diferentes interpretações das leis pelos juízes...delícia! Aí ela me vem com o papo de que tango é só caminhar. Ha-ha. "Yeah, right!". "Ok, I'll show you." A gente levanta e ela diz que vai guiar. Eu paro, olho, levanto uma sombrancelha... "What? You wanna lead?" Haha, claro que sim! Mas não sei como, então, não tem jeito: ela põe a mão nos meus ombros, eu seguro os braços dela e ela manda eu fechar os olhos - outra levantada de sombrancelha. Segundo ela, é mais fácil pra ser guiada. Ela diz pra eu sentir a força (Ui, menina, não faz/faz assim!) que ela faz com os braços, que é pra onde eu devo ir. A gente dá duas, três voltas. Umas risadas, giradinhas.

Aí as outras meninas da mesa voltam: entre elas a menina com quem ela tava dançando. Quando paramos a "andadinha" de tango e ficamos conversando, a outra vem por trás e abraça a guria, te olhando com cara de "essa aqui tem dona". Opa! Nós voltamos pra mesa, eu sento e elas vão dançar. A namorada faz questão de beijar a gatinha enquanto me olha. "Xii!"
Eu assisto mais um pouco a Milonga - elas dançam bem - e vou me despedir. "Why so soon?" "Por causa da tua mulé que quer me matar!" penso.

Andando pro albergue eu me sinto satisfeita. Valeu muito ter "só" assistido.

Seus dias na cidade vão passando entre cafés, caminhadas, corte de cabelo novo, o fim dos seus Blues favoritos, caderninho sendo escrito e muito frio.

E uma decisão: cansei de mulheres sem atitude. Quer, vem buscar!
Não entendo por que ficar esperando a outra chegar. Se gostou do que viu, vai lá, oras.

E pra vocês, meu lugar favorito:


Puerto Madero


¡Hasta luego!

3 Comments:

Anonymous Carmen Sandiego se meteu e disse...

A-ha-za, Bill!

7:25 PM  
Blogger Mrs. Dalloway se meteu e disse...

Adorei o texto, filhote!!!!!! Arrasou mesmo.

7:14 PM  
Blogger Capa Azul se meteu e disse...

tava procurando umas dicas do "universo feminino" em BA e achei seu blog. parabéns! adorei o texto. Ao menos agora sei do Brandon e do Tango Queer.
=)

1:48 PM  

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